A adolescência é uma invenção relativamente recente. É uma instituição historicamente determinada, um fenômeno da Modernidade, que atinge o jovem do Ocidente por ocasião da eclosão da puberdade, quando, por falta de dispositivos sociais em geral presentes nas sociedades pré-modernas ou não ocidentais, a passagem da criança ao jovem adulto se tornou problemática.
A adolescência, longe de ser puramente biológica ou social, é antes o produto do impacto pubertário e a intensificação de exigências sociais sobre o jovem em vias de deixar a infância, sob certas condições de cultura que caracterizam a civilização ocidental hoje.
A Antropologia nos ensina que nas sociedades mais tradicionais ou não ocidentais, a passagem da infância à idade adulta é mais claramente pontuada do que entre nós, algo como uma travessia que se faz de forma gradual e facilitada por práticas sociais, feitas através da iniciação.
Os modelos de iniciação são diferentes de uma sociedade para outra, mas servem à integração social do sujeito no mundo adulto. Ele adquire um nome e aprende aquilo que deve saber sobre os valores da sociedade, dentro da qual seu lugar está reservado. O rito faz imagem, metaforiza a problemática interna do sujeito. A adolescência aí reencontra o seu sentido.
Os judeus possuem uma cerimônia especificamente masculina (bar mitzvah) ou feminina (bat mitzva) para este fim iniciático. Trata-se de uma equiparação do sujeito perante a lei. Ele passa a ser responsabilizado e deverá responder perante a lei por seus atos. Por seu desejo, em compensação, deverá batalhar por sua própria conta e risco.
Na nossa sociedade ocidental o único modelo de passagem da infância ao estatuto adulto que se oferece às crianças é o modelo escolar – e o da imagem midiática – e o adolescente chega à idade adulta sem garantia nenhuma quanto ao seu lugar.
Assim, tornou-se necessário ao jovem adolescer quando desapareceu da vida social a eficácia dos ritos tradicionais, que possibilitavam a conversão do real implicado nos apelos corporais e sociais da puberdade em significante constituinte para o sujeito de sua subjetividade adulta.
Na ausência da eficácia ritual acima referida, o apelo corporal e social atinge o jovem sob a forma do não-simbolizado, isto é, sob a forma do real: aturde-o, sidera-o, produz-lhe estranhamento e o mantém estupefato e mudo. O adolescer é portanto o substituto e o herdeiro da eficácia ritual perdida na modernidade, que surge quando a passagem da criança ao adulto tornou-se problemática.
Podemos então supor que, como produto da modernidade, a adolescência veio responder à necessidade da subjetividade de produzir em seu interior algo novo, que funcionasse em equivalência com aquilo que desaparecera fora.
O processo da adolescência deve durar o tempo necessário para realizar, na intimidade do sujeito, aquilo que o ritual tradicional, provido da eficácia que ele encontrava na sociedade pré-moderna, podia realizar em um tempo bastante curto.
Adolescer é solicitar uma moratória – é “pedir um tempo” – ao apelo pubertário e social. O trabalho psíquico que é feito na adolescência é do mesmo teor do que ele substitui. O que lá era uma prática social, aqui é uma tarefa solitária, o que lá se dava com tranqüilidade, aqui é feito sob crises e tensão, o que lá estava armado pela tradição, aqui se dará pela invenção.